Para coronel da corporação, número de armas em circulação é incalculável. Especialista avalia que somente a cooperação federal pode conter a chegada deste arsenal ao Rio
Rio - Em meio a uma nova crise na segurança
pública, o coordenador de Comunicação da Polícia Militar, coronel
Frederico Caldas, divulgou dados assustadores. Somente neste ano foram
apreendidos 109 fuzis no Rio de Janeiro, uma média superior a um fuzil
por dia. Para o oficial, não há estimativa de quantos outros estão nas
mãos dos traficantes.
“Os números atuais são preocupantes. Um fuzil
por dia é muita coisa. A quantidade de armas é incalculável”, disse o
coronel Frederico Caldas.
Para ele, a PM não tem condições de resolver o
problema sem a ajuda das polícias Civil e Federal. Segundo o oficial,
sem uma cooperação, inclusive internacional, o trabalho da corporação
será insuficiente.
“Contrabando de armas é um crime
federal. Fuzis do tipo AK-47 são fabricados na Rússia, em Israel ou na
Turquia. O Brasil precisa rastrear essas informações, como número de
lote, data de fabricação, para quem foi vendido. Não é simples, mas tem
que ser feito. Senão, não tem jeito”, explicou Caldas.
A pesquisadora Silvia Ramos, coordenadora do Cesec (Centro de Estudos sobre Segurança e Cidadania), tem opinião semelhante.
“Se PMs forem abandonados nas
comunidades, sem inteligência e investigação, o sistema será corroído. O
tráfico de armas está intenso. Não é possível que não se faça uma
simples escuta para descobrir de onde estas armas estão vindo”, afirmou.
O deputado estadual Marcelo Freixo
(Psol), que presidiu a CPI das Armas na Assembleia Legislativa, vai
ainda mais além. “Existe o problema dos fuzis e fronteiras, mas 86% das
vítimas de violência no estado vêm das armas produzidas aqui. Há uma
falha no controle dos paióis públicos, às lojas e ao comércio”, diz o
deputado.
Os PMs que participaram da operação
que resultou na morte do menino Eduardo de Jesus Ferreira, de 10 anos,
quinta-feira, já depuseram no inquérito instaurado pela Polícia Civil e
tiveram suas armas apreendidas. Ontem à tarde, eles estiveram novamente
na Delegacia de Homicídios, na Barra, para serem ouvidos.
Quatro policiais da UPP do Alemão e dez do
Batalhão de Choque estavam no local onde o menino foi baleado. Segundo
fontes da Polícia Civil, um confronto com traficantes teria ocorrido na
área.
A perícia feita na escadaria onde o crime
ocorreu não conseguiu localizar o projétil que atingiu Eduardo, mas
recolheu cápsulas no local. A polícia trabalha com a hipótese de que o
tiro que atingiu Eduardo tenha saído de uma pistola.
Mãe desabafa sobre o caixão: "O maldito vai pagar"
A dor e a revolta dos pais e de centenas de
amigos em relação à morte trágica de Eduardo de Jesus Ferreira, de 10
anos, foram a marca do velório e enterro do menino, realizado ontem à
tarde no Piauí, terra natal da família. O corpo da criança chegou àquele
estado durante a madrugada e foi velado na casa de uma tia. Em seguida,
os parentes se despediram da criança no Cemitério de Corrente, a mais
de 800 km da capital Teresina.
Inconformada, a mãe do menino, Terezinha de
Jesus, fez desabafo emocionado sobre o caixão do filho: “Vou fazer
vencer a Justiça. Aquele maldito que tirou sua vida vai pagar. Se eu
pudesse, eu mesmo acabaria com a minha vida”. A família deve ficar na
cidade por dez dias, até decidir a mudança de vez para a região, já que
não pretende morar mais no Complexo do Alemão.
Nesta terça-feira, na primeira aula
de leitura do projeto Anjos do Bem sem o menino Eduardo, a mesa do
estudante ainda estava intacta, assim como a sala que ele ajudou a
arrumar. “Um dia antes de ele morrer, ficou depois da aula me ajudando a
arrumar. Essa era a característica mais forte dele: se preocupar com as
pessoas”, disse a professora Camila Oliveira.
Participativo, suas fotos nas
atividades, como na leitura de livros para idosos em um asilo, estavam
em cartazes feitos por seus colegas. A turma deu as mãos e fez um minuto
de silêncio antes de a aula, em homenagem ao menino, começar. O clima
era de muita comoção. “Era um aluno muito querido por todos, carinhoso.
Na última aula ele não queria ir embora e me abraçou”, lembrou a
professora.
Também nesta terça, parentes de Elisabeth
Alves, de 41 anos, assassinada no dia 1º, dentro de casa, no Alemão, se
reuniram com membros das comissões de Direitos Humanos das câmaras
estadual e federal. Eles também ouviram os relatos de Denise Moraes da
Silva, que viu seu filho ser morto em maio do ano passado, no complexo.
O deputado federal Paulo Pimenta (PT-RS) vai
agendar audiência pública na comunidade. O deputado federal Jean Wyllys
(Psol-RJ) vai investigar, numa CPI, casos de violência contra jovens
negros em periferias de todo o país. Membros da comissão deverão visitar
o Complexo do Alemão.
Fórum traz esperança de dias melhores
A realização do fórum ‘Alemão, Saídas para a
Crise’, depois de amanhã, na sede do Instituto de Estudos da Religião
(Iser), na Glória, levou a esperança de dias melhores para líderes
comunitários. O encontro, realização do DIA
, do Iser e o Centro de Estudos de Segurança a Cidadania, da
Universidade Cândido Mendes (Cesec), reunirá a sociedade civil em busca
de soluções para conter a escalada da violência no Complexo.
“Será um marco para fugirmos desse círculo
vicioso”, diz a estudante de jornalismo Daiene Mendes, diretora da ONG
Voz da Comunidade, que edita um jornal na favela. Lúcia Cabral, diretora
da ONG Educap, questiona: “Queria saber como essas armas entram na
comunidade com tantos policiais aqui dentro.”
Emergência para as UPPs
O governo estadual anunciou que construirá
bases definitivas das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) em caráter
emergencial, mesmo que para isso tenha que passar por cima da lei. “Tem
muita burocracia para vencer. Se precisar responder a processo, vou
responder. O bandido não espera licença ambiental, não podemos esperar
também”, disse o governador.
Pezão também se queixou da dificuldade para
adquirir terrenos para as novas UPPs e disse que, se preciso for, as
unidades fixas serão erguidas mesmo sem títulos de propriedade.
De acordo com Pezão, serão empregados R$ 70
milhões doados pela Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) para as novas
bases. Porém, na lei da Alerj que autoriza a doação, foi definido que
apenas R$ 29 milhões dos R$ 70 milhões são destinados à construção e
reforma de UPPs.
O resto da quantia é para compra e manutenção
de 370 patrulhas da PM e 370 rádios, construção de uma escola de Ensino
Médio e um centro vocacional na Maré, além de uma delegacia na região,
instalação e manutenção de câmeras em 953 patrulhas da PM e a reforma
geral do Centro de Formação e Aperfeiçoamento de Praças (CFAP).
Além disso, o governador anunciou que tomará
medidas para fortalecer a pacificação. Uma das estratégias, segundo ele,
é ampliar o número de convocações dos policiais concursados. “Já
integramos à PM mais de 1.100 policiais nos três primeiros meses deste
ano. Temos seis mil novos policiais militares concursados em fase de
admissão. E se precisar aumentar o número, o faremos para reforçar não
somente as UPPs”, afirmou Pezão.
Reportagens de Athos Moura, Caio Barbosa, Constança Rezende e Felipe Freire
http://odia.ig.com.br/noticia/rio-de-janeiro/2015-04-07/pm-apreendeu-109-fuzis-desde-o-inicio-do-ano.html