Trabalhar o dia inteiro para estudar
a noite, conseguir empréstimos com financiadoras, amigos ou bancos,
pedir ajuda da família, vender alguns bens. Esses são alguns dos
recursos de milhares de estudantes brasileiros de universidades
particulares para tentar, com muita devoção e pindaíba, se manter na
sala de aula. Como prêmio, recebem ao final do ano, dos bondosos
empresários da educação superior, um novo reajuste no valor das
mensalidades, muitas vezes bem acima dos índices da inflação.
Donos de universidades privadas tratam a
educação como se fosse a venda de um artigo de luxo qualquer, cujo
preço varia a bel prazer do fornecedor e cuja finalidade é o seu
enriquecimento. No entanto, lucrar acintosamente sobre o ensino dos
outros é ilegal. A educação é considerada, pela constituição brasileira,
como um direito fundamental. Exatamente por isso, não pode ser tratada
como um produto ou serviço qualquer, sendo pautada por leis específicas
que impedem os reajustes e valores abusivos por parte das universidades.
“Os alunos das particulares devem ficar atentos e procurar conhecer muito bem essa legislação, denunciando imediatamente qualquer abuso junto ao seu CA, DA, DCE, mesmo individualmente ou por meio de um grupo de estudantes”, afirma o presidente da UNE, Daniel Iliescu. Ele se refere à lei federal 9870/1999, que determina as regras para o preço do ensino superior. Entre as principais obrigações das universidades está a apresentação pública de planilhas com todos os custos da instituição, entre eles pagamento de pessoal, infra-estrutura, contas a pagar, reformas e melhoria nos cursos. Os reajustes deverão ser fundamentados, somente, com base nesses dados e na necessidade comprovada da instituição em ampliar seus investimentos.
“No entanto, mesmo assim ocorrem muitos
casos de abusos como tivemos, por exemplo, recentemente em algumas
universidades do Rio de Janeiro”, diz o presidente da UNE, referindo-se
aos aumentos irregulares das Universidade Gama Filho e da UniverCidade,
que subiram o valor das mensalidades em uma média de 25%, gerando
protestos dos estudantes das intituições e da União Estadual dos
Estudantes do Rio de Janeiro (UEE-RJ).
A UNE já chegou a apresentar uma
proposta de projeto de lei criando ainda mais mecanismos de controle
dessas irregularidades, o PL da UNE. “Atualmente, defendemos na verdade
completa reforma do ensino privado que possa, ao mesmo tempo, garantir a
qualidade da educação e impedir a política de lucros a qualquer custo”,
ressalta Iliescu.
Tem algo errado no ensino privado
A justificativa para o aumento no valor
das mensalidades, muitas vezes, argumenta a melhoria nos salários e
condições de trabalho de professores e outros funcionários. No entanto,
segundo a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de
Ensino (Contee), o aumento da receita das universidades privadas não
está sendo revertida em benefícios para quem trabalha nas instituições.
Segundo a coordenadora geral da
entidade, Madalena Guasco, trata-se de uma manobra dos patrões donos de
instituições privadas: “O patronato analisa o desenvolvimento econômico
do país e estabelece um panorama muito favorável para o ajuste de
mensalidades muito acima da inflação”, denuncia. De acordo com Guasco,
enquanto isso, a realidade dos trabalhadores não se altera, evidenciando
a lógica do lucro e do pouco comprometimento com a qualidade do ensino.
Com base nesse cenário, a Contee lançou a
campanha “Tem algo errado no ensino privado”, cujo objetivo é alertar
sobre as instituições que insistem em tratar a educação como uma
mercadoria. Segundo a entidade, o Brasil vive um bom momento, com queda
do desemprego, crescimento de matrículas nas instituições privadas e
economia estabilizada, porém essa realidade promissora e otimista não se
reflete em conquistas para os trabalhadores das instituições de ensino.
Na opinião do presidente da UNE, a luta
contra os abusos do ensino superior precisa envolver estudantes,
professores, funcionários e todos aqueles que compreendem o verdadeiro
sentido da educação para o futuro do país: “Universidades nunca podem
ser apenas fábricas de diplomas. Trata-se de um espaço para debate,
reflexão e transformação da nossa sociedade que deve se pautar,
fundamentalmente, na inclusão social do máximo possível de indivíduos,
na transferência democrática do conhecimento e nunca na exploração
financeira”, sintetiza.
Fonte: Por Artênius Daniel e Rafael Minoro no EstudanteNet