Organização reforça a necessidade de implementação da Política Nacional de Saúde Integral da População Negra como forma de combater o racismo patriarcal cisheteronormativo no SUS
Após 16 anos de oficialização da Política Nacional de Saúde Integral da População Negra PNSIPN, que busca combater o racismo estrutural nos serviços e atendimentos do Sistema Único de Saúde (SUS), quase nada foi feito. Os efeitos desse descaso são sentidos diariamente pela população negra, principal usuária do SUS. Recentemente, um caso ocorrido na Clínica da Família Alkindar Soares, em Guaratiba, chamou atenção de Iya Katiuscia – liderança religiosa no Terreiro Òbá Labi e parceira de CRIOLA no projeto Saúde das Mulheres Negras. Por uma falha de comunicação do médico, uma gestante ficou 1 mês sem saber que havia testado positivo para HTLV – vírus que torna a gestação de alto risco e pode causar problemas neurológicos graves, como a paralisia das pernas.
Foi necessária a intervenção da liderança junto à unidade para que providências fossem tomadas. Ainda assim, a gestante enfrentou novos problemas, como a necessidade de recoleta do exame por "amostra insuficiente" e o atendimento grosseiro de uma enfermeira de plantão.
Casos como esse mostram a falha do sistema público de saúde e o abismo que mulheres negras precisam cruzar para ter o direito básico de um parto seguro.
Dados da Pesquisa Nascer no Brasil II: Inquérito Nacional sobre Aborto, Parto e Nascimento, realizada em parceria com a Fiocruz, que utiliza informações do SUS (Sistema Único de Saúde), apontam que, enquanto o número de mortes maternas está em aproximadamente 46,5 mortes para cada 100 mil nascidos vivos para mulheres brancas, no caso das mulheres pretas, é mais que o dobro: 100,4 óbitos para cada 100 mil nascidos vivos.
O que é o Projeto Saúde das Mulheres Negras
O Projeto Saúde das Mulheres Negras é uma iniciativa da ONG CRIOLA voltada a fortalecer o protagonismo político e a incidência das mulheres negras cis e trans no sistema de saúde, com foco na Atenção Primária e no enfrentamento ao racismo patriarcal cisheteronormativo. É, também, uma estratégia de transformação do SUS sob a perspectiva racial e de gênero, articulando política, incidência institucional e mobilização comunitária para garantir o direito à saúde integral das mulheres negras no município do Rio de Janeiro e mais nove municípios adjacentes.
Como resultados práticos em 10 meses de projeto, mais de 1400 participações em reuniões de mobilização de rede local, quase 500 parceiros mobilizados e mais de 130 reuniões com autoridades. Mulheres que haviam abandonado o sistema de saúde por conta de negligência voltam a frequentar as unidades básicas de saúde (UBS), agora com mais ferramentas para se defender. Elas mesmas passam a buscar as lideranças para relatar problemas e buscar encaminhamentos.
Sobre CRIOLA
CRIOLA é uma organização da sociedade civil fundada em 1992 e conduzida por mulheres negras. Atua na defesa e promoção de direitos das mulheres negras em uma perspectiva integrada e transversal, tendo por missão trabalhar para a erradicação do racismo patriarcal cisheteronormativo, contribuindo com a instrumentalização de meninas e mulheres negras, cis e trans, para a garantia dos direitos, da democracia, da justiça e pelo Bem Viver.