Estudantes ousaram falar de sonhos de um futuro melhor, de uma educação digna, da esperança de um parlamento que os ouça
“Que tempos são estes, em que é quase um delito falar de coisas
inocentes, pois implica silenciar tantos horrores”, questionou em um
poema o dramaturgo e poeta Bertold Brecht (1898-1956).
Neste dia 29 de novembro, em Brasília, foi este o delito dos
estudantes brasileiros: falar de coisas inocentes. Estudantes de
ocupações de todo o Brasil que ousaram ocupar suas escolas e
universidades para mostrar sua voz, vieram para a capital federal em
nome dos seus sonhos.
Sonhos de um futuro melhor, de uma educação digna, da esperança de um parlamento que os ouça.
O objetivo maior uniu diferentes forças do movimento estudantil em um
cordão à frente da marcha, todas as siglas e coloridos das camisas
marchavam num passo só. Uniu também professores e
técnico-administrativos que vieram em caravanas apoiar a manifestação. E
não silenciaram horrores, denunciaram os retrocessos da PEC55 e uma MP
da reforma do Ensino Médio ineficaz que querem enfiar guela abaixo da
comunidade escolar.
A festa pacífica de bandeiras, gritos de ordem e baterias acompanhou o
cortejo por toda a Esplanada dos Ministérios. No espelho d’água o
tradicional mergulho, a celebração da chegada, a irreverência da
juventude. O intuito dos estudantes era acompanhar dali a votação no
Senado Federal sobre a mudança na Constituição que pode acabar com as
possibilidades de futuro de todos os jovens brasileiros ao congelar por
20 anos investimentos na educação.
Mas não foi isso que decidiu a polícia sob o comando do governador
Rolemberg. Como se manifestar-se fosse crime, os estudantes foram
tratados como criminosos. Uma chuva de bombas, spray de pimenta e balas
de borracha transformou o cartão postal da capital em um espetáculo de
barbárie. Dezenas foram feridos e os apelos por paz da presidenta da
UNE, Carina Vitral, do caminhão de som não foram ouvidos. O gás
lacrimogêneo tomou conta e ensinou uma terrível lição aos milhares de
meninos e meninas que lutam para ser protagonistas de suas vidas: a PM é
inimiga dos estudantes.
Dispersos sob violência, perdidos, feridos e assustados, muitos só
queriam voltar para casa. Até isso a polícia impossibilitou. A chuva de
bombas não cessou até a noite, tornando impossível retornar as centenas
de ônibus estacionados nos arredores da Esplanada.
Dentro do Senado Federal nenhum dos seus gritos foram ouvido.
Indiferentes a mobilização de 50 mil pessoas a sua porta, os senadores
aprovaram em primeiro turno por 61 votos favoráveis e 14 contrários.