SAÚDE
Brasileiro está mais obeso, diabético e com pressão e colesterol mais altos
Estudo sobre doenças crônicas com a participação do da USP traz um retrato preocupante da saúde no País
A saúde da população brasileira adulta não vai bem. As pessoas estão
mais obesas, um terço tem hipertensão, muitas delas desenvolveram
diabetes e quase metade tem colesterol alto. A avaliação é do
médico Paulo Lotufo, e tem um fundamento bem sólido: dados levantados
no Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (Elsa-Brasil), que ele
coordena na USP desde 2008.
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Obesidade é uma das doenças crônicas que mais atinge os brasileiros
Obesidade é uma das doenças crônicas que mais atinge os brasileiros
A primeira divulgação dos resultados do Elsa-Brasil a um público mais
amplo foi feita no dia 1º de fevereiro no HU (Hospital Universitário) da
USP, uma das bases operacionais do projeto. A apresentação trouxe um
retrato das principais doenças crônicas no País – arterosclerose,
enxaqueca, hipertensão, diabetes e dislipidemia (presença de gordura no
sangue). Estas patologias crônicas são as responsáveis pelos maiores
índices de mortalidade e morbidade no Brasil e seu aumento,
principalmente a partir dos anos 1960, têm gerado altos gastos para o
SUS (Sistema Único de Saúde).
O projeto Elsa testou e validou algumas medidas e escores de pesquisas
já realizadas em populações no exterior com doenças cardiovasculares,
para saber em que medida os critérios desses estudos poderiam ser
aplicados à população brasileira. De forma geral, houve similaridade,
inclusive com relação aos fatores de risco: obesidade, hipertensão
arterial, colesterol elevado e diabetes. Em uma próxima etapa, serão
considerados outros elementos como diversidade racial e hábitos de vida
dos brasileiros.
USP em alerta
O público pesquisado na USP é composto por professores e funcionários.
Para esse grupo, o cardiologista Márcio Sommer Bittencourt, pesquisador
do Elsa e um dos palestrantes do evento, não têm boas notícias. Segundo
ele, apesar destes servidores terem mais acesso aos serviços de saúde do
que a população em geral, andam com hábitos de vida não muito
saudáveis. Mesmo sendo um pequeno subgrupo analisado, pouco mais de 5
mil, os participantes “uspianos”, quando comparados à maioria da
população brasileira, estão mais obesos ou com sobrepeso, fazem
menos atividade física fora do ambiente de trabalho e têm maior
propensão ao diabetes.
Cecília Bastos/ USP Imagens
Do total de mais de 5 mil participantes 'uspianos', 35% apresentaram diagnótico de hipertensão
Do total de mais de 5 mil participantes 'uspianos', 35% apresentaram diagnótico de hipertensão
Em relação ao acompanhamento da própria saúde, porém, o grupo da USP
está em melhor situação. Dados da pesquisa sobre hipertensão arterial
mostram que dos 35% dos participantes da USP que tiveram diagnóstico de
hipertensão, 80% já tinham conhecimento dessa informação, enquanto que
na população brasileira esta média cai para 50%.
Bittencourt espera que os exames realizados pelos servidores, cujos
resultados foram entregues individualmente para cada participante,
sirvam de estímulo para que cuidem melhor de si mesmos. Isso com o
objetivo não apenas de melhorar sua expectativa de vida em anos, mas de
ter uma “perspectiva de saúde mais prolongada”.
Elenir Aguilhera de Barros, de 72 anos, professora aposentada do
Departamento de Letras da FFLCH (Faculdade de Filosofia, Letras e
Ciências Humanas) da USP, esteve o tempo todo sentada na primeira fila
do evento a fim de acompanhar a apresentação dos trabalhos – e garante
se sentir muito bem assistida pelo Elsa. Não só fez vários exames para
investigar alguns problemas de saúde, conta ela, como também teve acesso
ao acompanhamento psicológico para aposentados.
Enxaqueca e doenças tiroidianas
Além de doenças cardiovasculares, os resultados apresentados trouxeram
dados sobre enxaqueca e doenças da tireoide. A pesquisadora Alessandra
Goulart anuncia que o brasileiro está mais “enxaquecoso”, ou seja, ele
tem mais episódios de dores de cabeça durante sua vida – cujos sintomas
são dores pulsantes, náuseas, perda parcial da visão e sensibilidade
à luz e ao som.
Apesar de não haver ainda nenhum estudo comprovando o crescimento do
problema, há uma prevalência da enxaqueca aumentada em toda a América
Latina. A novidade do estudo nessa área foram as evidências encontradas
de que há correlação entre as pessoas que sofrem de enxaqueca e de
transtornos de ansiedade e depressão.
Sobre doenças tiroidianas, há indícios de que a levotiroxina
(medicamento utilizado no tratamento do hipotireoidismo) esteja sendo
receitada de forma inadequada aos pacientes. Segundo a pesquisadora
Isabela Benseñor, o diagnóstico de hipotireoidismo subclínico (forma
mais branda da doença, geralmente sem sintomas, mas detectável em
exames) é feito pelo Elsa a partir da dosagem dos hormônios e de
informações do paciente se ele faz uso ou não da levotiroxina. A partir
desse procedimento, foi possível observar que há mais pessoas com
hipotireoidismo clínico do que com hipotireoidismo subclínico, o que
sugere que “tem mais gente do que deveria usando a levotixoxina”,
adverte Isabela.
Projeto Elsa-Brasil
A investigação multicêntrica do projeto Elsa-Brasil vem sendo
desenvolvida desde 2008 com cerca de 15 mil pessoas entre 35 e 74 anos
de várias instituições públicas de ensino superior e pesquisa
das regiões nordeste, sul e sudeste do Brasil. Na USP, são 5.061
voluntários que participam do trabalho. O objetivo é investigar, a longo
prazo, a incidência e os fatores de risco para doenças crônicas. A
importância das pesquisas do Elsa se confirma na área de saúde pública
brasileira. Os resultados vão servir de subsídio para direcionamento e
adequações de políticas públicas. As ações do SUS, dos programas de
atenção primária e do sistemas privados terão impactos direto dos
resultados dessas pesquisas, conclui Lotufo.