Vírus da hepatite C é silencioso e destrói o fígado aos poucos. Medicamento, com poucos efeitos colaterais, já é considerado por médicos como uma quebra de paradigma no tratamento da doença; entenda o porquê
Esta
terça-feira (28) pode ser considerada um marco para a saúde pública
brasileira no tratamento da Hepatite C, um vírus que se aloja no fígado e
o destrói lentamente, levando à cirrose hepática e, na maioria dos
casos, ao transplante de fígado.
Na
data que se comemora o Dia Mundial da Luta contra Hepatites Virais, o
inovador medicamento, que cura, em média, de 90% a 95% dos casos de
hepatite C, será fornecido pelo Sistema Único de Saúde (SUS), para
pacientes com doença avançada no fígado.
O esquema de tratamento é
composto por diversas substâncias ativas dentro de apenas um
comprimido, tomado uma vez ao dia, por um período que varia de 12 a 24
semanas, dependendo do estágio da doença.
A elegibilidade para o
novo tratamento será feita de acordo com um protocolo de tratamento no
SUS. Segundo o hepatologista da Sociedade Brasileira de Hepatologia,
Raymundo Paraná, o Brasil é o primeiro da América Latina a oferecer
o tratamento gratuitamente.
“O País fará priorização de pacientes, não serão todos que terão acesso”, adianta ele.
“Cirróticos
e pacientes com evolução para a cirrose terão prioridade. A única
exceção é para pacientes com HIV, que terão acesso amplo ao tratamento”.
A expectativa sobre o novo tipo de tratamento tem
fundamento em pesquisas, que mostraram a capacidade do medicamento de
oferecer até 100% de cura. Além disso, os poucos efeitos colaterais são
bem tolerados pelos pacientes, o que não acontecia com as terapias
antigas.
“Foi uma mudança completa de paradigmas no tratamento da
hepatite C. Saímos de um esquema que já tinha avançado muito – mas que
ainda era baseado em interferon e ribavirina – para outro tratamento
oral, com tolerância excepcional e eficácia superior”, diz Paraná.
“Dependendo do estágio da doença e do genótipo da pessoa, a resposta pode variar entre 80% e 100%”.
A
hepatologista do Hospital 9 de Julho, Marta Deguti diz que, além das
altas taxas de cura, a grande vantagem é a possibilidade de fazer o
tratamento somente por via oral, sem injeções semanais, como no caso do
tratamento antigo.
Por mais avançado que fosse o tratamento
anterior, as taxas de cura ainda eram mais baixas e os efeitos
colaterais, incapacitantes. Fadiga intensa, anemia, queda de cabelo,
perda do apetite, náuseas, dores de cabeça, dores musculares e
depressão, além de outros tantos, acompanhavam quem tentava se livrar do
vírus.
Marta, no entanto, não acredita que a facilidade de cura daqui por diante tornará o vírus da hepatite C algo “banal”.
“Não
acho que ele vai ser encarado como uma gripe, simplesmente pelo fato de
ser um vírus silencioso e que infecta o fígado, um órgão vital
multifuncional. Tiradas todas essas ressalvas, espero que em 10 anos a
hepatite C tenha se tornado um problema bem mais controlado do que é
hoje”, diz.
A maior parte das infecções, segundo Raymundo Paraná,
aconteceu entre as décadas de 70 e 90, por causa das transfusões de
sangue contaminado. Até 1994, não havia um teste eficaz que detectasse o
vírus no sangue.
“Atualmente estamos diagnosticando pessoas com mais de 20 anos de infecção crônica. São os que mais preocupam”.
Como o vírus danifica o fígado
O
vírus entra no corpo por meio contato com sangue contaminado. As portas
são abertas por alicates de cutícula, seringas contaminadas, ato sexual
desprotegido, tatuagens feitas sem a esterilização correta das agulhas
e, no passado, transfusões de sangue sem os devidos testes, hemodiálise,
uso de seringas de vidro sem esterilização correta e dentistas que não
usavam autoclave.
++ Veja na galeria a seguir hábitos e crenças populares podem prejudicar o seu fígado:
Procure
não engordar. A obesidade causa gordura no fígado, condição que recebe o
nome de esteatose hepática. Foto: Thinkstock/Getty Images
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A
partir dessa contaminação, o fígado desenvolve uma infecção aguda. O
corpo, no entanto, dá sinais bem parecidos com aquele de gripe ou
resfriado, o que torna difícil uma pessoa saber que foi contaminada.
Depois dessa fase aguda, ele, silenciosamente, começa a lesionar o
órgão. E fica ali por anos. Em alguns casos, a cirrose hepática aparece
em poucos anos. Em outros, demora cerca de 20 anos.
Quando
os primeiros sinais da doença aparecem, o fígado está muito machucado
e, muitas vezes, não há mais o que fazer. Alguns pacientes conseguem um
transplante de fígado, enquanto outros não resistem ao tempo de espera
pelo órgão compatível.
“Há cirróticos de classe A e B.
Alguns têm cirrose classe A, mas têm uma funcionalidade íntegra do
fígado. Nesse caso, o medicamento traz uma melhora substancial da
doença, e a cirrose pode até regredir”, explica Paraná.
“Já
no caso do cirrótico classe B, em que o paciente está em um grau da
doença em que se pensa em transplante, dependendo do funcionamento do
fígado, o medicamento pode estabilizar a doença e ele não precisar fazer
o transplante”.
Em todo o mundo, 160 milhões de pessoas
carregam o vírus. No Brasil, estima-se que cerca de dois milhões
estão infectados. O exame para detectar o vírus, portanto, é necessário
para aqueles que passaram por situações de risco.
“A imensa
maioria ainda não foi diagnosticada. Talvez 100 mil pessoas tenham sido.
As outras 900 mil estão por aí, sem saber”, preocupa-se Paraná.
http://saude.ig.com.br/minhasaude/2015-07-28/hepatite-c-novo-tratamento-fornecido-pelo-sus-cura-90-dos-casos-entenda.html