Por essa, nem o Homem-Aranha,
super-herói dos quadrinhos, esperava. A fabricação de teias de aranha
em laboratório é realidade para pesquisadores brasileiros, que, no
futuro, podem também fazê-las crescer em plantas.
A pesquisa é desenvolvida na Embrapa Recursos Genéticos e
Biotecnologia, em Brasília, e liderada pelo pesquisador Elíbio Rech. Ele
explica que a teia de aranha é um produto com alta aplicabilidade comercial e a forma como pode ser produzida define o conceito de sustentabilidade e uso racional da biodiversidade.
“Nós não precisamos mais entrar na floresta para pegar nenhuma
aranha. Você vai lá, conhece as propriedades, pega alguns poucos
organismos, retira o que precisa e nunca mais volta, você faz sintético.
Esse é o caminho real de sustentabilidade, usar a tecnologia para que você não tenha que devastar a floresta para isolar um determinado composto”, disse o pesquisador.
Rech conta o caso da artemisina, produzida pela planta
artemísia, um forte componente contra a malária. “Foi feita uma
avaliação e começaram a produzir em larga escala, mas foi economicamente
inviável porque precisava de áreas enormes. Então, usando a engenharia
genética, um grupo da Califórnia produziu em levedura e o composto foi
lançado por uma empresa
farmacêutica no ano passado. Um produto contra a malária, que veio de
uma planta, mas que não precisa mais usar a planta, você faz tudo
sintético.”
A pesquisa da Embrapa começou em 2003 com a prospecções na Amazônia,
na Mata Atlântica e no Cerrado de aranhas que produzem fibras e o
mapeamento genético das glândulas que produzem as proteínas que vão dar
origem à seda da teia.
Segundo a pós-doutoranda da Universidade de Brasília (UnB) Valquíria
Lacerda, que trabalha no projeto, a criação em laboratório das proteínas
da aranha é feita pela bactéria Escherichia coli. “Ainda não existe um
organismo ideal para produzir em grande quantidade. Tem pesquisadores
que já colocaram em células de mamíferos, de insetos, em bactéria, o
mundo inteiro ainda procura uma biofábrica ideal para fazer extração
reduzindo o custo desse material”, disse a bióloga.
O passo seguinte consiste na extração das proteínas. Para isso, a
massa de bactérias E. Coli é diluída em meio líquido e as proteínas de
teia de aranha são resgatadas com uma sequência de DNA específica. Com
auxílio de uma seringa especial que simula a espirineta (órgão da aranha
que expele a teia), os pesquisadores vão liberando e enrolando a fibra.
“Da última vez, de 100 microlitros, que é a décima parte de um
mililitro, conseguimos fazer um fio muito grande, foram mais de 10
metros, rendeu bastante”, contou Valquíria, explicando que as fibras de
teia de aranha natural podem variar de 2 a 4 nanômetros e a produzida na
Embrapa tem em torno de 40 nanômetros. “De 20 a dez vezes mais espesso
do que encontramos na natureza, o que pode ajudar a ser mais forte”,
destacando que os próximos passos envolvem testes de extensão e
resistência.
Para explicar os possíveis usos dessa fibra, o pesquisador Elíbio
Rech faz a comparação com o plástico, ou seja, serve para quase tudo. “É
um material novo que tem duas características, flexibilidade e
resistência, e também é biodegradável. Ele tem uma característica física
que permite um melhor desempenho para tudo.
Pode ser usado na produção de tecidos, em fios para sutura, para quem
tem alergia ao nylon, por exemplo, e também em nanopartículas para o
endereçamento preciso de drogas e medicamentos no corpo humano.
Também em composições metálicas e plásticas para placas e peças de
aviões e para os cascos de navios. “Qualquer material que dure mais vai
reduzir o custo de manutenção. Ao conseguir fazer com que um material
trabalhe mais e seja mais leve, você também reduz o gasto de
combustível, reduz emissão de gás carbônico na atmosfera, então tem todo
um ganho direto e indireto do uso de um material como esse”, disse
Rech.
Além das inúmeras aplicações e benefícios para o desenvolvimento de
diversos setores da economia, o fato de os estudos serem baseados em
aranhas brasileiras permite agregar valor à biodiversidade nacional.
Segundo Rech, a tecnologia da produção de fios de teias de aranha já
está dominada. O próximo passo é definir um meio econômico, rápido e
seguro para a sua produção em larga escala. “O nosso interesse era
juntar as duas coisas, que nós possamos produzir essa fibra, que está
sendo feita hoje em bactéria, em uma semente de soja ou em outra planta,
de forma a reduzir o custo de produção.”
Os pesquisadores já fizeram testes preliminares para introduzir em
plantas, mas precisam de mais pessoas para compor o grupo. “No setor
público temos dificuldade em manter os grandes cérebros, as pessoas vêm,
ficam um tempo, recebem outras propostas e acabam saindo. Isso não é
ideal para o projeto, mas faz parte da formação, o país ganha com isso”,
disse Rech.
Para o pesquisador, a empresa pública já cumpriu seu papel de gerar
um ativo tecnológico ao produzir essas fibras em bactérias. “Esse é um
potencial produto muito importante, agora o setor privado tem que fazer a
outra parte, escalonar e transformar isso em um produto comercial.
Ainda precisamos reduzir um pouco o custo de produção, nós saberíamos
como fazer, também com outro laboratório e equipamentos, mas, como eu
disse, faltam pessoas para colaborar com a gente.”
A utilização de plantas, micro-organismos e animais geneticamente
modificados como biofábricas é estudada para a produção não apenas
desses fios, mas também de medicamentos e outros insumos essenciais à
população.
Na Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia são desenvolvidos
estudos em plantas de soja transgênica capazes de produzir o fator 9,
uma proteína responsável pela coagulação do sangue. Os hemofílicos não
produzem essa proteína e precisam dela para melhorar a sua qualidade de
vida.
Também há a soja com gene que estimula o hormônio do crescimento
(GHC) e plantas transgênicas para combater a aids. “A soja é uma planta
realmente maravilhosa porque é uma semente que tem 40% de proteína e o
restante de óleo”, disse Rech. “Você tem uma semente e um sistema de
produção fenomenais. É imbatível.”
Segundo a Embrapa, o faturamento da biotecnologia na indústria
farmacêutica mundial cresceu muito nas últimas décadas e hoje alcança
aproximadamente US$ 10 bilhões ao ano. Os produtos biotecnológicos estão
em franco desenvolvimento e hoje alcançam 10% dos novos produtos
atualmente no mercado.
Todas essas pesquisas são realizadas em parceria com outras unidades
da Embrapa, instituições de pesquisa e universidades do Brasil e do
exterior. Com informações da Agência Brasil.http://www.focoregional.com.br/page/noticiasdtl.asp?t=Pesquisadores+brasileiros+desenvolvem+teia+de+aranha+sintetica&idnoticia=112243