Por conta da paternidade recente, Roberto Domingues, 40 anos, até deu um tempo nas visitas aos bordéis, mas não conseguiu ficar afastado muito tempo.
Frequentador assíduo das zonas de prostituição
de todo o Brasil há 23 anos, ele voltou a fazer peregrinações constantes
pelas áreas marcadas pelo sexo pago e pela exclusão total dos programas
de saúde pública.
Robertinho – assim ele é conhecido pelas
“tias” e “primas” das esquinas brasileiras –, é psicólogo, casado e pai
de uma menina de 2 anos. Advogado recém-formado, ele mora em Belo
Horizonte (MG) e escolheu as prostitutas como bandeira pessoal.
Roberto: ele começou o ativismo em favor da saúde das prostitutas em 1989
Desde 1989 – quando foi contaminado pelo
ativismo da luta contra aids – Robertinho defende os direitos deste
grupo populacional, constantemente acusado de ter sido (e ainda ser) o
grande transmissor do vírus HIV “aos homens de bem”.
“Quando você se aproxima delas, percebe que a realidade é totalmente diferente”, defende o psicólogo.
“As prostitutas sempre fizeram fila para pegar as
camisinhas que distribuíamos, em uma época que ninguém sabia que
precisava ou queria usar. Foram as grandes professoras dos homens sobre
como colocar o preservativo que eles usariam depois com as namoradas.”
Apesar da cautela que as prostitutas sempre tiveram com o
sexo, “elas ainda são vistas só como uma ‘grande vagina’ pelos serviços
de saúde e pelos programas governamentais”, compara o psicólogo.
“Quando o sistema pensa nelas, lembra apenas das doenças
sexualmente transmissíveis (DSTs). Elas ficam à margem de qualquer outro
programa de saúde. É isso que queremos mudar”.
Mulheres antes
Roberto Domingues afirma que as prostitutas, antes de
qualquer julgamento sobre como ganham a vida, são mulheres. Por este
motivo, “estão vulneráveis aos problemas que passaram a ameaçar o
cenário feminino de forma global”.
A aids está, de fato, mais presente no universo delas, em especial entre as que passaram dos 50 anos
, mostrou o último levantamento do Programa Nacional de DST e Aids.
Porém, o inquérito feito pelo Ministério da Saúde indica que os casos de
hipertensão
, colesterol alto
, obesidade, infarto
e acidente vascular cerebral (AVC)
estão mais numerosos entre as mulheres de todas as profissões e representam perigo ainda maior do que o HIV para a mortalidade.
Maria da Paz, conhecida por Diana, é prostituta no Rio
Grande do Norte, e confirma a ameaça destes vilões da saúde às colegas
de profissão. Ela assumiu a presidência da Associação das Profissionais
do Sexo e Congeneres do RN depois que a antiga líder, Marinalva
Ferreira, morreu em decorrência de um AVC com apenas 46 anos.
“Marinalva teve de lutar muito para conseguir um
atendimento sem burocracia, para toda a classe. Mas nunca conseguimos
ultrapassar a prevenção, diagnóstico e tratamento das Dst/Aids”, diz
Diana.
“É como se o nosso corpo fosse constituído apenas por
órgãos sexuais. O AVC, que tirou a vida dela, é doença muito comum entre
nós.”
Por todos nós
O caso de Marinalva é emblemático, avalia Roberto, e não é único.
“O preconceito contra as prostitutas também faz parte do
atendimento médico, elas enfretam dificuldades para fazer pré-natal,
cuidar da alimentação ou ser encaminhadas ao cardiologista”, diz.
Por isso, no ano passado quando assumiu a presidência da
Rede Brasileira de Prostitutas, o psicólogo estabeleceu como uma das
metas mudar o olhar sobre a saúde destas brasileiras. Um benefício,
acredita, que seria estendido à população em geral.
“Uma das nossas reivindicações é o funcionamento 24 horas
das unidades básicas de saúde, que beneficiaria, além dos profissionais
do sexo, todos os trabalhadores noturnos, como caminhoneiros, garçons e
DJs, por exemplo”, cita o psicólogo.
Dos encontros para discutir a saúde das prostitutas,
Roberto pinçou um dado curioso: 30% dos clientes procuram prostitutas só
para conversar.
"Elas podem ser grandes disseminadoras de bons
hábitos de saúde, caso recebam informações sobre isso. As políticas
públicas não priorizam a saúde delas de forma integral, como deveriam – e
como é direito delas – mas podiam ao menos levar isso em conta”, diz.
“Se lá no passado elas ensinaram os homens a
colocar a camisinha. Podem muito bem informá-los sobre como controlar o
colesterol ou prevenir a hipertensão”, questiona.http://saude.ig.com.br/minhasaude/2012-09-07/prostitutas-podem-atuar-em-favor-da-saude-publica.html